A Revista Íntegra, após cinco anos de publicações, chega ao fim.
Convidamos você a conferir esta última edição. Saiba mais...

segunda-feira, 7 de março de 2011

A Mulher Desdobrável - Matrioscas

Quando eu era menina, certo dia encontrei uma caixa diferente entre as coisas da minha tia. Ela era de madeira fina, dourada, e tinha a forma de um cubo de aproximadamente dez centímetros de lado. Abri e dentro dela encontrei outra caixinha, um pouco menor. Retirei-a do interior da primeira , abri a tampa e outra caixinha apareceu. A última era uma caixinha minúscula e dentro dela havia um papelzinho dobrado onde estava escrito: “você é a razão do meu viver”.

Não lembro quantas vezes realizei o gesto, mas sei que foram muitas caixas que abri, pois o canto onde realizei essa façanha ficou repleto das mesmas.

Muitos anos depois recebi um presente de uma amiga que havia chegado da então União soviética. Era uma Matryoshka, uma boneca típica, símbolo nacional e muito reputada como souvenir. A minha amiga explicou que dentro daquela bonequinha de madeira haviam outras iguais, mas de tamanhos menores, numa sequência que variava de cinco a oito e que se repetia em escala decrescente. Nessa época eu morava muito longe da minha terra natal e aquele presente me trouxe de volta à infância. Sorri, comecei a abrir as bonecas e o episódio das caixas da minha tia vieram à tona. Arrumei-as com muito carinho, enfileiradas, sobre a estante.

Depois aprendi que essas bonecas surgiram na época do Império Russo, em 1890, quando instituiu-se a produção de brinquedos educativos e folclóricos. As primeiras Matryoshkas reproduziam as camponesas com seus trajes coloridos. Aprendi, também, que a primeira Matryoshka foi pintada por Serguei Malútin para ser exposta na feira internacional de Paris, em 1900 – onde ganhou medalha de ouro por sua originalidade. Atualmente ela se encontra no Museu do Brinquedo em Serguiev Posad. E a partir daí as Matryoshkas vêm sendo cultuadas como símbolo nacional e objetos de desejo dos colecionadores.

Essas bonecas representam a família. A tradução literal do nome Matryoshka é “mãezinha” (mãe = mater; e oshka, o diminutivo). Também aprendi que apesar da importância dessas bonequinhas no artesanato russo, elas têm sua origem no Japão. Em 1890 um brinquedo que representava um sábio budista, foi trazido do Japão e presenteado à família Mamôntov, grandes patrocinadores das artes no virar do século. Usando o boneco japonês como modelo, o artesão Vassily Zvyôzdotchkin e o pintor Serguei Malútin criaram então a primeira Matryoshka russa, batizando-a com uma variação do nome russo Matryona, que deriva de mat’ (mãe). Mostrada com grande sucesso no pavilhão do Império Russo na exposição internacional de 1900 em Paris, desde então as Matryoshkas são meio de vida para os artesãos e fazem a alegria de quem as recebe como presente.

Há pouco tempo descobri que a famosa Matryoshka, também é conhecida como Baboushka. Finalmente, também descobri que carregamos conosco muitas Matryoshcas. Temos uma aparência externa, a grande matriosca, a que todo mundo vê, e no interior, várias outras, parecidas, cada uma delas carregando consigo predicados e defeitos. São elas que nos fazem fortes, destemidas, ousadas, desaforadas, sábias, justas, ou inconsequentes. São elas também que vacilam, sofrem e choram. O importante, porém, é o renascer constante; é a sabedoria de olhar lá fora e descobrir saídas possíveis. E como diz Adélia Prado, “Mulher é desdobrável. Eu sou”.E temos várias camadas, digo eu, como as Matryoscas!

Leni David (do blog: http://lenidavid.com.br)

Um comentário:

Leni David disse...

Saibam que fiquei muito feliz ao encontrar meu artigo sobre as Matrioscas aqui na Revista íntegra. Muito obrigada!