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sexta-feira, 24 de setembro de 2010

A vida alheia nas lentes de Jim Marshall

Comecei a escrever o texto abaixo em abril deste ano mas depois veio minha mudança e ele ficou perdido em alguma caixa ainda não aberta no porão. Agora que tudo voltou ao normal (se é que isso é possível) consegui tirar a poeira dele.
De acordo com a Tia Wiki (Wikipédia), a palavra italiana paparazzo é utilizada para designar os repórteres que fotografam pessoas famosas sem autorização, expondo em público as atividades que eles fazem em seu cotidiano. Após conseguir as fotografias os paparazzi podem vendê-las a imprensa por valores significativos.
O termo deriva de uma metáfora e uma sinédoque do escritor Ennio Flaiano descrevendo fotógrafos, comparando a lente da câmera à abertura e fechamento das válvulas de moluscos, que são chamadas no dialeto abruzzese de “Paparazze“, e por extensão a pessoa por trás da câmera. Haveria, ainda, um grande mosquito siciliano denominado "paparaceo".
Calhou que vou me mudar da pacata Suíça - onde pessoas famosas podem por escolha própria chegar a vivenciar o ostracismo - e morar num lugar cheio de celebridades e repórteres fotográficos.

Em minha última visita a esse futuro lar, estabanada do jeito que sou, quase tropecei em três paparazzi . Eles estavam na calçada, em frente a um salão de beleza, tentando fotografar alguma beldade que estava fazendo as unhas. A manicure saiu de dentro do estabelecimento e começou a discutir com os fotógrafos. Eles a ignoraram e continuaram fotografando.
Eu nem olhei para dentro do salão para ver quem estava por ali. Victoria Beckham? Ah, mas essa não mora mais por aquelas redondezas. Coleen Rooney? Sei lá, e quer saber, nem me interessa.
Triste coincidência: no mesmo dia (24 de março de 2010) os jornais anunciavam a morte de Jim Marshall, aos 74 anos, o fotógrafo que registrou cenas inesquecíveis no mundo do rock e jazz.
Jim começou sua carreira na década de 1960. O primeiro retrato foi o resultado de um encontro fortuito com John Coltrane nas ruas de São Francisco. Coltrane estava perdido na cidade e tinha um show na mesma noite. Jim, espertíssimo, ofereceu uma carona ao famoso saxofonista mas com uma condição: poderia fotografá-lo durante o show.
Daí por diante só vieram fotos imortais. A foto do Jimi Hendrix queimando a guitarra no
Monterey Pop foi dele. A do Johnny Cash cantando na penitenciária também. Foi ele que mostrou pra todo mundo que Janis Joplin e Grace Slick não eram rivais como se parecia, fotografando as duas na casa de Grace.
Diferentemente dos paparazzi de hoje, Jim Marshall tinha a confiança das pessoas famosas que fotografava. Isso lhe dava livre acesso atrás dos palcos. Suas fotos eram autorizadas e tornou-se amigo de muitos dos músicos que fotografou. Era visto como um grande profissional, quase como um rock star.
Seus retratos eram uma análise psicológica dos astros de rock, numa época em que espectador e fotógrafo interessavam-se mais pelo caráter do artista do que pela fofoca ou ibope que as fotos poderiam gerar ou representavam.
Quando revejo seu trabalho, fotos na maioria em preto e branco, sinto uma tremenda vontade de ter estado ali onde ele esteve, de ter ido naquele show, de ter escutado aquela canção naquele momento. Jim dizia que não era por acaso que suas fotos eram musicais pois ele “via a música”.
Seu talento, ética e paixão pela fotografia foram e são exemplares. Virtudes que faltam nos
paparazzi e nas celebridades de 15 minutos da atualidade.

Magda Hammer - Manchester, Inglaterra

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