A Revista Íntegra, após cinco anos de publicações, chega ao fim.
Convidamos você a conferir esta última edição. Saiba mais...

domingo, 27 de julho de 2008

Mas, afinal, que diabos é Integração?
Amo as palavras e tenho imenso respeito por elas. São pecinhas de um jogo infinito, com as quais se pode brincar pela eternidade.
Como em todo jogo, porém, vejo nelas armadilhas... é preciso saber jogar - e muito bem - para não sairmos perdendo ou, pelo menos, para empatarmos as inúmeras partidas que jogamos nessa vida, cada vez mais dependente da comunicação.
Os efeitos de um comentário, uma conversa, uma discussão, um texto (e por aí vai), podem ser belíssimos, prazeirosos ou, ao contrário, podem pesar como uma sentença sobre nossas cabeças.
Algumas palavras mal colocadas, em determinadas situações, detonam relacionamentos, outras desconstroem em segundos nossa imagem. Muitas têm significados sutilmente contraditórios...
Uma delas, em especial, passei a temer: integração, talvez por ser uma das muitas que está na ordem do dia, na boca de 10 entre 10, digamos, estranhos no ninho, como eu.
Vou ao dicionário. O Aurélio esclarece: Integração: “ato ou efeito de integrar-se, de tornar inteiro, completar, de reunir-se, incorporar-se”. O que me remete a Integrado : “diz-se de cada uma das partes de um todo que se completam ou complementam”, e daí a Íntegro : “inteiro, completo”; e ainda: “imparcial, inatacável”.
Há anos trabalho com “integração” (seja lá o que isso for), de onde se deduz que trabalho neste processo de tornar uma pessoa inteira, completa, incorporada ... imparcial ... inatacável ?
O que tenho acompanhado, porém, é quase o oposto. Assisto diariamente à desconstrução de muitas pessoas (crianças e adultos), na busca desta “incorporação”.
Nada contra mudanças, o ser humano tem capacidade de adaptar-se ao meio em que vive. Eu acrescentaria: desde que não perca seu cerne, seu centro. Difícil é estabelecer onde ele está !
Voltando às palavras e à comunicação...
Muitas coisas que pensamos e dizemos, muitos valores que retiramos de frases escutadas, contribuem para dificultar essa busca de provar que “sou-tão-inteligente-quanto-você-e-mereço-respeito” (Num contexto mais relax, seria o equivalente a “vamos trocar figurinhas?”!)
Uma frase mal elaborada, especialmente se não dominamos perfeitamente as palavras num novo idioma, nos torna vulneráveis, tolos e uma dúvida imediatamente se instala na cabeça do interlocutor: “Será este um ser inteligente, digno de atenção?”. Coisas mínimas, com efeito máximo!
Vejamos algumas dessas pérolas (as mais “light” !) que venho colecionando e que já renderam afastamentos e dissabores:
“Ich werde den Brief schinken” (“Quero enviar esta carta“ ... enviar é schicken, schinken quer dizer presunto!) ... Comentário irônico do interlocutor: “Ai, você está me dando uma fome ...” – e passou a trabalhar com outro grupo do escritório ...
Da brasileira para a vizinha: “Darf ich meine Schwierigmutter vorstellen?” (schwierig, quer dizer difícil, Schwiegermutter é sogra!). Comentário: “Ela é tão difícil assim???“ A relação nunca passou de inevitáveis cumprimentos cordiais na porta de casa ...
No trem há 3 lugares livres, mas quem chega pergunta: “Ist es noch frei?” (“Estes lugares estão livres?”). E a resposta, dada pelo incalto (leia-se gaiato !) brasileiro: “Não tou vendo ninguém aí !”, gerou um esbravejado: “Wie bitte?” (Coooomoooo?) - e muitos ininteligíveis resmungos depois, com cara feíssima...
Um garoto brasileirinho para a professora suíça, ao não responder a um exercício de matemática: “Minha cabeça está vazia” ...Resultou em encaminhamento imediato para o psicólogo ...
Chamar alguém não íntimo de “Du” (o nosso tu) já me rendeu: “Sou racista sim, contra a ignorância!!!” ???
“Ich möchte meine Freiheit” (“Quero minha liberdade”), dito pelo namorado, queria dizer fim de relacionamento??? Ou apenas: “Deixe-me tirar férias com meus amigos” ?????????
E sigo me perguntando: onde a reunião? A idéia de complementaridade? Integrar, incorporar, complementar? Como, quem, com quem, pra quê, para quem?
Volto ao dicionário. Integração “ato ou efeito de integrar-se, de tornar inteiro, completar, de reunir-se, incorporar-se”. O que me remete a Integrado : “diz-se de cada uma das partes de um todo que se completam ou complementam” e daí a Íntegro : “inteiro, completo”; e ainda: “imparcial, inatacável”.
E concluo: só pode estar faltando alguma coisa na definição ...

Miriam Müller Vizentini – Baden, Suíça

4 comentários:

marcia pereira disse...

Integração é mesmo uma coisa complexa. E mais complexa ainda na Suiça alemã. Eu admiro muito os brasileiros que moram e curtem morar nessa parte da Suiça. Confesso que, para mim, não foi fácil. Para conseguir ser respeitada como profissional, tive que aprender o Hochdeutsch. Penso que isso deve ser um requisito para todos que queiram ter um bom trabalho ou estudar nessa região. Tudo bem. Mas, para alguem realmente integrar-se na Suica,alemã, é essencial tambem aprender o suiço-alemão. E esse, apesar de entender bastante, eu não consegui dominar. Para mim, o fato de não dominar a lingua local é muito penoso. Voltar para o Reino Unido, onde já havia morado pelo mesmo tempo que morei na Suiça - mais ou menos 6 anos e meio - foi como voltar para casa. Claro que não falo como uma pessoa local e agora, ainda tenho um sotaque suiço (que é principalmente detectado pelos alemães, quando me ouvem falar inglês) - mas a minha capacidade de entender e me fazer entendida é muitissimo maior. Apesar das saudades dos grandes amigos brasileiros e suíços feitos nesses 6 anos e meio de Suiça, sinto-me bem melhor aqui. Ufa! Posso respirar de novo!

Anônimo disse...

Hahaha, divino. Bater um papo contigo ja é uma delicia, tudo no papel fica melhor ainda, pois da para ler e reler. Manda mais!

Unknown disse...

É, talvez os curiosos de plantão, ao lerem o artigo, devam estar se perguntando: do quê é que essa moça está falando? Oras, morar em um outro país requer sacrifícios inevitáveis, quer sejam eles linguísticos quer sejam eles de relacionamentos interpessoais !
Tsc, tsc, tsc, bobagem! INTEGRAÇÃO, palavra que nós brasileiros entendemos tão bem (ou pensamos entender!) pode mesmo causar problemas a qualquer um em qualquer parte do planeta. o ponto de vista aí talvez seja o de "fazer parte de algo maior". e nesse ponto a autora e por um acaso minha irmã têm razão. está mesmo faltando alguma coisa...talvez a palavra tolerância tenha um espaço nessa definição.
um beijo grande e parabéns pelo artigo. saudades....

Anônimo disse...

Integrarsi...completarsi... come se arrivando in Svizzera saremmo degli esseri incompleti! Io ho capito che per integrarsi ed essere accettato in questo paese non basta nascere, né crescere né tantomeno naturalizzarsi. Paese, che in molti punti di vista è incompleto se non addirittura carente e povero. Io non voglio impoverirmi, bensì arricchirmi, per questo non lascerò per nulla al mondo le cose positive della mia prima patria. La Svizzera è l'unico paese al mondo che considera i cosiddetti "secondos" (definizione che detesto, perché non siamo secondi a nessuno)degli stranieri, anche se siamo svizzeri a tutti gli effetti: Facciamo parte della vita politica, votiamo regolarmente e siamo parte integrante del sistema sociale. E smettiamola di vergognarci, perché pensiamo di non parlare bene la lingua... Lingua? Non dimentichiamo che si tratta di un semplice dialetto, che dunque non viene scritto e non ha nessun valore, comparato alle antiche culture e lingue mondiali che hanno grandi tradizioni letterarie. In tutte le altre parti del mondo il dialetto si usa nell'ambito famigliare e non se ne abusa nell'ambito ufficiale e lavorativo, come si fa qui. Qui infatti, il tedesco perfetto non lo parla nessuno. E non è certo questo dialetto, che per molti versi può essere anche simpatico parlarlo, che aprirà il paese verso l'era della globalizzazione... Jolanda